Ficamos facilmente ofendidos
Quando alguém fala de nosso temperamento é como se pairasse no ar a malévola impressão que estamos sendo atacados em nossa honra por monstros, que de dedos em riste, apontam diretamente para nosso rosto.
Costumamos ficar muito ofendidos. E em seguida, irritados, nossos sentimentos geram um turbilhão de pensamentos em defesa de nossas pobres almas feridas. Isso quando já não partimos para um ataque franco.
Geralmente criamos desculpas esfarrapadas, nas quais muitas vezes, infelizmente, até acreditamos de verdade, para justificar tal e qual comportamento. Como alguém ousa sugerir que temos este ou aquele defeito, não é mesmo?
Bem, levando em conta que muitas vezes o autor das “terríveis” acusações nem está presente quando, por exemplo, nos irritamos ao ler um artigo ou um post sobre esses assuntos, obviamente somos nós mesmos que vestimos a carapuça sozinhos. O que é bom, pois ao menos mostra que ainda somos fisgados por algo em nós que clama por mudanças. Pior seria se muitos se queixassem da mesma coisa a respeito de nosso temperamento, por exemplo, e sequer notássemos.
As saudáveis lutas internas
Se esperneamos é porque estamos lutando. Lutando contra nós mesmos, é claro. Aquela luta que travamos entre quem somos e quem fingimos ser. Aquela batalha contra nossas verdades ocultas, escondidas lá nas entranhas de nossa alma, e que não passam de segredinhos de polichinelo.
É tolice achar que ninguém percebe nossos defeitos e quem somos de verdade. Nossa prepotência, todavia, nos faz acreditar nisso.
E se você argumentar que seus amigos não reclamam, mesmo que discretamente, de você, comece a desconfiar que eles têm os mesmos problemas, isto é, no fundo são parecidos com você. Quando não percebemos os defeitos dos outros é porque são pontos cegos para nós, isto é, não destoam no meio dos nossos.
Quem gosta de beber umas a mais, por exemplo, não costuma reparar nos que se embebedam a seu lado. E se, num rasgo de honestidade e lucidez, nota os exageros, faz vistas grossas a eles. Ou simplesmente não se incomoda.
No final quem mais sofre somos nós mesmos
O que todos parecem esquecer é que muito além das queixas, verbalizadas ou não, que as pessoas possam ter a nosso respeito, nós também sofremos com nosso temperamento. No fim da linha dessa armadilha estamos nós, e sozinhos, porque ninguém sofrerá nossas dores no nosso lugar.
Senão, vejamos alguns exemplos.
Tudo do nosso jeito
Quando somos prepotentes, achamos que sabemos tudo e queremos que todas as coisas saiam do nosso jeito ou estejam sob nosso controle; para isso tentamos anular os outros como seres pensantes, causando sofrimento quando temos poder para nos impor. Só esquecemos que essas mesmas pessoas se afastarão de nós assim que puderem, pois ninguém gosta de ser rebaixado à categoria de idiota.
Mas, o que nos esquecemos mesmo é que viveremos dentro de nosso próprio inferno astral; aquele criado por nossas raivas e frustrações. A maioria das pessoas sensatas ou sem medo, ou ainda aquelas que escapam de nosso controle, terminam, com o tempo, não se importando mais com nossas demandas por conta de nosso jeito de ser. O lobo come o menino.
Além disso o prepotente gera em si mesmo dores físicas de todo tipo, pois seu corpo, mais cedo ou mais tarde, responderá à energia acumulada pela insatisfação raivosa.
Os outros não existem
Quando somos egoístas e só pensamos em nós mesmos, o que parece ser o grande problema desta humanidade, não é difícil perceber os males que causamos: roubamos, matamos ou simplesmente guardamos o melhor pedaço de bolo para comermos sozinhos. Não importa.
No fim sofreremos, pois ficaremos sozinhos ainda mais depressa que o prepotente; só nos sobrarão os pares que conosco desfrutam de nossa colheita indigna. Os demais continuarão a nos criticar ou então a nos ignorar, pois ninguém gosta de ser a opção B, aquela que aparece só quando o egoísta precisa de alguma coisa.
Mas, todos, amanhã ou depois, também vão nos abandonar.
Agressividade gera agressividade
Quando somos intolerantes costumamos ser preconceituosos e agressivos e o máximo que conseguimos é que também sejam agressivos conosco, pois a maioria das pessoas não tolera ser desqualificada ou tratada sem cortesia. E, novamente, quando temos algum poder seremos capazes de causar muito sofrimento. Nos esquecemos, todavia, que ao deixarmos sempre muito claro que o outro não passa de um tolo, em especial quando ele defende suas verdades particulares ou, simplesmente, discorda das nossas, sofreremos as consequências dessa atitude. E depois, no frigir dos ovos, como ninguém gosta de fato de nós porque tendemos a ser rudes, como não soubemos nos fazer amar, o melhor que conseguiremos, se não formos muito beligerantes, é sermos solenemente desprezados. Porque, se exagerarmos a dose, seremos odiados.
Nada mais que mendigos
Quando somos invejosos desejamos aquilo que avaliamos ser a razão da felicidade alheia. Cobiçamos, geralmente de forma secreta, as coisas dos outros, seja esta coisa um bem material, emocional ou de outra característica. Cobiçamos o poder aquisitivo, as relações afetivas, a inteligência, a religião, as conquistas, etc. Se confrontados, todavia, negamos veementemente.
Estamos sempre de olhos espichados para fora de nós. Nos transformamos em pedintes silenciosos do universo, especialmente quando não temos forças ou capacidade de correr atrás do que queremos.
Não compreendemos os porquês de nossas limitações e sofremos com nossas frustrações; além disso, logo as pessoas estarão nos chamando de melindrosos ou hipócritas.
E tudo termina em sofrimento
E por aí vai. Falaremos sobre cada uma de nossas dores nos próximos posts.
Mas o que se vê mesmo é que todas se originam e convergem para os mesmos pontos e muitas vezes se complementam. No fim sofremos porque não aceitamos mudanças. Nunca desistimos de nossos pontos de vista, ou seja, de sermos quem somos. Não enxergamos que podemos nos tornar pessoas melhores, diferentes e mais felizes.
Até quando vamos bater a cabeça na parede?
Resumo:
– não sabemos lidar com as frustrações da vida; não percebemos que as emoções geradas por elas nos causam dores físicas e emocionais
– causamos muitas dores e sofrimento às pessoas, especialmente as mais próximas, com nosso jeito de ser; nossas necessidades são mais importantes
– não abrimos mão do que achamos ser o certo, mesmo que uma multidão esteja gritando o contrário; preferimos sofrer